Desconheço tudo de Isabelle Eberhardt tanto mais que
penso conhecer um pouco da sua vida. O seu rosto, construído ao sabor de
leituras já que dele possuo poucas fotografias, conserva os traços essenciais
dessa voz que se foi moldando pela visão dos desertos e das dunas.
Uma questão coloca-se-me com alguma insistência.
Saber até que ponto este rosto não será mais autêntico do que o “verdadeiro”,
aprisionado num fim de tarde de Tunes sobre um papel hoje provavelmente já
amarelecido.
Suponhamos que possuo de Isabelle uma biografia
honesta e uma boa fotografia. Nada me garante que exista a mínima coincidência
entre as duas.
Se me interrogar como R. Barthes a propósito de Piet
Mondrian “Como é possível ter-se um ar inteligente sem se pensar em nada de
inteligente” e pensar como é possível ter um ar sereno quando essa vida é um
incêndio, corro seguramente o risco de supor ter encontrado a resposta na
própria voz de Isabelle sem ter que procurar muito : “A embriaguez terrível e
violenta dos sentidos, intensa, delirante, contrasta singularmente com a minha
existência de todos os dias, calma, reflexiva.”
Já não é o caso da mulher aparentemente vulgar que de
noite se veste de jovem cavaleiro turco que aqui me interessa. É já toda e
qualquer vida.
As biografias só são imaginárias, como quase defende
M. Schwob, porque as próprias vidas não o são menos, mesmo para quem as vive,
atrevo-me a dizer.
A minha vida só me parece mais real porque a vejo.
Obviamente, penso, os biógrafos verão apenas parte dela, quando não mesmo outra
coisa. Naturalmente não me apercebo que comigo sucede o mesmo.
(texto antigo, reeditado sem alterações)
Ainda estou para perceber se aprecio mais os seus textos ou as suas fotografias. O mais certo é gostar muito de ambos.
ResponderEliminarEu tenho uma dificuldade imensa em escolher o que aparece primeiro. Também é por isso que gosto imenso das suas escritas densas a luz sobre as coisas.
ResponderEliminarMuito obrigado.