20120403

Melancolia





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Quem nasce numa cidade portuária nunca chega verdadeiramente a sair dela. Transporta-a dentro de si como um nómada o deserto ou um náufrago o ultimo cigarro.
A sirene de um barco contém em si toda a melancolia do mundo, porque os grandes navios não chegam, apenas partem.
Aconteceu-me numa cidade estrangeira  ouvir esse som carregado de bruma no meio do intenso movimento dos carros e do ininterrupto ruído de fundo. Assim que me foi possível procurei o porto como quem procura droga, ou um bálsamo.
Esse bálsamo é triste e calmo. Uma mistura de melancolia e simultânea vontade de partir e de ficar. 

4 comentários:

  1. JMV, apetecia-me tanto ter um livrinho escrito por si, para ir folheando agora ou depois... É que cada vez que escreve, só me apetece dizer : exacto, é isso mesmo, percebo :D...
    Por isso digo: exacto, é isso mesmo, percebo...

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  2. Muito obrigado pela sua simpatia, Margaridaa.
    Uma vez, faz bastante tempo, escrevi um pequeno texto que era assim:
    .
    «…obviamente não me preocupei com o seu regresso, disse Marta terminando o Martini a goles incrivelmente regulares.
    Passado um bocado disse “vamos fingir que é Fevereiro. Toda esta gente está a fazer um filme qualquer, daqui a dois dias não estará ninguém na praia uma vez que é de um filme que se trata. Queres?”
    Olhei para a esplanada. É Fevereiro, pensei. Quando ia a responder reparei que estava sozinho, o que me pareceu lógico. O que estaria Marta a fazer comigo em Fevereiro naquela esplanada?
    “Podias perfeitamente escrever um romance. Podia começar assim.”
    Para quê, perguntei, e à maneira de Borges devo ter respondido qualquer coisa do género só escrevem romances os pobres tipos que não são capazes de escrever um conto.
    Olho a esplanada de novo. Terão passado quantos anos? Vem-me à memória o convite de Marta. Sorrio igualmente perante a ideia de escrever um romance.
    Não é isso que tenho feito este tempo todo ao ter dito, sim, é Fevereiro, não está ninguém na praia?»
    .
    Realmente é o que tenho feito este tempo todo, Margaridaa. 53 anos a fingir que é Fevereiro e que não está ninguém na praia.

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  3. Adorei a fotografia.
    Acho que ela é um hino à saudade e à espera do regresso de algo.
    E o pormenor do chão molhado com os respectivos reflexos tremidos, para mim, é aquilo que deu-lhe o verdadeiro ser.

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  4. quem nasce no Alentejo sem porto nem cidade, fica exactamente assim a olhar o mar...

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